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Mirian Goldenberg – antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Foto de Cristina Lacerda
Jornal Mulier – Fevereiro de 2012, Nº 97
Mirian Goldenberg afirma que passamos a quase totalidade de nossas vidas nos preocupando e sofrendo com o nosso corpo
Mulier – Mirian, poderia nos contar sobre suas origens, formação e atuação profissional?
Mirian – Eu nasci em Santos, filha de mãe polonesa e pai romeno, que vieram para o Brasil com cinco anos. Sou a terceira de três irmãos homens, única menina de uma família de origem pobre. Meu pai se formou como advogado quando éramos crianças e conseguiu ser o advogado trabalhista mais conhecido de Santos, depois o vereador mais votado da cidade. Aos 16 anos, fui morar em São Paulo, para estudar. Na verdade, acabei sendo uma militante estudantil, pois estávamos na época da Ditadura Militar. Em 1978 vim morar no Rio de Janeiro, com meu primeiro marido. Fiz mestrado em Educação e trabalhei durante seis anos em uma ONG. Decidi voltar a estudar e fiz, em 1988, o doutorado em Antropologia. Logo após defender a tese, ingressei como professora na Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde trabalho até hoje.
Mulier – Quando e por que você começou a pesquisar sobre as mulheres?
Mirian – Desde a minha época de militância política, aos 16, 17, 18 anos, interessei-me pelo tema. O livro decisivo, nesta fase, foi “O Segundo Sexo”, de Simone de Beauvoir. Mas li muito, desde cedo, sobre a mulher, a desigualdade entre os sexos e posso dizer que vivi esta desigualdade dentro de casa, sendo a única menina no meio de três irmãos. A pesquisa sobre o tema, de forma mais sistemática, começou durante o meu doutorado, em 1988. Mas, antes disso, já havia escrito o livro “Nicarágua, Nicaraguita: um povo em armas constrói a democracia”, no qual falava das mulheres nicaraguenses e da desigualdade entre homens e mulheres na Nicarágua sandinista.
Mulier – Leila Diniz, considerada uma mulher libertária para a década de 1960 e 1970, foi um de seus temas de pesquisa. Como você analisa hoje o título do seu livro “Toda mulher é meio Leila Diniz”?
Mirian – Leila foi e é uma referência importantíssima em tudo o que escrevo e penso. Ela foi o que todas as mulheres desejam ser: livre, feliz, autêntica, espontânea, amiga, generosa etc. Leila foi uma mulher única, não encontro mulheres como ela. Ela viveu e fez o que queria, sem medo das convenções e da opinião dos outros. Sofreu muito por ser tão livre, mas correu riscos, pois acreditava na sua vontade. A liberdade de Leila foi e continua sendo um exemplo para todas nós. Acredito que poderíamos ser mais meio Leila Diniz, apesar da dificuldade que é ter a coragem de ser verdadeira e lutar contra as padronizações e modelos de ser mulher.
Mulier – Qual análise poderia fazer a respeito da relação casamento e infidelidade na contemporaneidade?
Mirian – Digo que, no Brasil, ter um marido é um capital, uma riqueza. As brasileiras que tenho pesquisado nestes 23 anos como antropóloga querem casar e ter filhos, diferentemente de outras culturas que tenho pesquisado, como a alemã. As brasileiras, mesmo as mais bem sucedidas profissionalmente, não abrem mão do casamento. São raras as que fazem esta escolha. E a fidelidade é o principal valor do casamento, não por uma questão moral. As brasileiras que tenho pesquisado querem se sentir únicas, especiais, insubstituíveis. E querem, também, ter um único parceiro que satisfaça todos os seus desejos de companheirismo, romance, proteção. É este desejo (ou fantasia) que faz a fidelidade ser tão importante no casamento.
Mulier – A questão do corpo e do envelhecimento vêm sendo temas atuais nas suas publicações. Em sua opinião, qual a importância dessa discussão?
Mirian – No Brasil, o corpo é um capital, uma forma de inserção social. Quantas mulheres brasileiras se tornaram ricas e famosas em função de ter um determinado modelo de corpo? Gisele é conhecida como “o corpo”. Na minha pesquisa, o corpo apareceu como um valor importantíssimo para as mulheres e para os homens também. Elas querem ser magras, jovens, perfeitas. E fazem loucuras para conquistar este objetivo. A saúde fica em segundo plano para muitas. As brasileiras que pesquiso sofrem muito em função destas questões e investem muito na aparência. Mesmo as mais magras e belas sofrem nesta cultura que valoriza a juventude e a magreza. Tenho pesquisado este tema desde os anos 1990 e percebo que a preocupação cresce, principalmente entre as meninas e adolescentes. O que significa que passamos a quase totalidade de nossas vidas nos preocupando e sofrendo com o nosso corpo. É este tipo de obsessão e sofrimento que tenho discutido, tentando encontrar saídas para os nossos sofrimentos.
Mulier – Como as mulheres de diferentes idades e categorias sociais estão lidando com o envelhecimento?
Mirian – Tenho pesquisado a questão do envelhecimento desde 2007. Percebo que as mulheres parecem se libertar desta obsessão com a aparência ao descobrirem outros valores e prazeres na maturidade. Muitas dizem: “é a primeira vez na vida que posso ser livre, que posso ser eu mesma, me cuidar. Pena que descobri o valor da liberdade tão tarde”. Elas se sentem muito mais felizes e realizadas depois dos 50, 60, 70, 80, colocam o foco no próprio prazer e desejos, buscam cuidar da saúde, qualidade de vida, bem-estar. Tenho encontrado mulheres felizes e ativas, aproveitando muito a liberdade que conquistaram. As mulheres mais jovens têm muito medo de envelhecer, temem a decadência do corpo e a falta de homem. As mais velhas priorizam a liberdade e a qualidade de vida. Parecem mais felizes.
Mulier – Seu novo livro tem como título “Corpo, Envelhecimento e Felicidade”. Poderia nos contar um pouco mais sobre a obra?
Mirian – Este livro é o resultado de um seminário internacional que realizei na Universidade Federal do Rio de Janeiro em setembro de 2010. Reuni os maiores pesquisadores nacionais e internacionais para refletirem sobre a questão do corpo, envelhecimento e felicidade, como o sociólogo francês Vincent Caradec e os antropólogos Myriam Lins e Barros, Guita Debert, Clarice Peixoto, Yvonne Maggie, José Carlos Rodrigues entre outros. É um livro com temas que interessam a todos, como cirurgias plásticas, sexualidade, lazer, aposentadoria, morte, etc. Todos os artigos são baseados em pesquisas empíricas, realizadas aqui no Brasil e na França. Depois de ter publicado o livro “Coroas: corpo, envelhecimento, casamento e infidelidade” (Ed. Record), publico este livro pelo selo Civilização Brasileira (também da Record) para continuar pensando e propondo soluções para o envelhecimento em nossa cultura. Pretendo continuar escrevendo sobre o tema, como tenho feito nas minhas colunas para o caderno “Equilíbrio”, do jornal “Folha de São Paulo”, e em minhas palestras. É um tema fascinante e muito importante para todos os que querem envelhecer bem. Compreender o significado e as formas de envelhecer na cultura brasileira e em outras culturas tem me ajudado muitíssimo a viver esta fase com mais saúde, humor e alegria. Espero que meus livros ajudem a todos, os que estão envelhecendo e os mais jovens que irão também envelhecer, a encarar o envelhecimento como uma fase que pode trazer felicidade, realizações e muitas descobertas.
Mulier – Como essas três questões estão entrelaçadas?
Mirian – Em uma viagem para a Alemanha, em 2007, percebi que lá as mulheres de 60, 70 anos não falam de envelhecimento. Falam de viagens, trabalho, vida cultural, amigos, casa etc. Aqui, aos 30, as mulheres estão preocupadas com rugas, celulite, gordurinhas, marcas de expressão, falta de homem… As brasileiras que pesquiso sofrem muito com a própria aparência e com o medo de envelhecer. Algumas só se libertam deste sofrimento muito tarde. Descobri que as mulheres mais felizes são aquelas que olham para os lados positivos do envelhecimento: maior segurança, confiança, maturidade, sabedoria, amigos, prazeres etc. E aquelas que sabem rir e brincar, não levar tudo tão a sério, não se preocupar tanto com detalhes e com a opinião dos outros. Envelhecer é um aprendizado, e muitas aprendem a ser feliz só com a maturidade. É isso que tenho buscado com meus livros: “Coroas” e “Corpo, Envelhecimento e Felicidade”: mostrar que existem muitas dimensões extremamente positivas que só são possíveis quando estamos mais velhos.
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